Depois de muito tempo sem escrever, eu senti a necessidade de falar sobre um assunto muito importante aqui nesta terra, que é o transporte. Eu tive várias discussões sobre este tema tȃo delicado. As pessoas com quem eu falei vieram de países subdesenvolvidos, onde você coloca uma cenoura na frente de um burro e ele vai puxar a carruagem. Para eles, o sistema de transporte daqui é uma maravilha, um pulo tecnológico de anos-luz, um deus que eles adoram e a quem oferecem mensalmente uma quantia de dinheiro para que ele não os deixe na mão. Mas como eu reclamei, quer dizer, falei a verdade, eles não acreditavam no que ouviram.
Eu não vou repetir o que eu falei, porque eu tive que usar uma linguagem mais expressiva para que as pessoas entendessem bem o meu ponto de vista. Eu venho de uma terra onde a pontualidade e a confiabilidade são um passatempo. Mas enfim, as pessoas olhavam para mim de bocas abertas e com uma expressão facial como se não acreditassem no que ouviam. Parece que a religião deles era o transporte daqui. Eu, nesta historia, virei o próprio demônio, com as pernas de cabra, um rabo comprido e os chifres na cabeça. Da minha boca saía o fogo do inferno em línguas diabólicas.
Eu vi o desespero das pessoas. Algumas se benziam, enquanto outras estavam buscando por qualquer coisa sagrada em redor deles, tentando achar um livro sagrado ou um frasco de água benta ou uma pistola com balas de prata ou um pedaço de alho. No estado mental deles, qualquer coisa servia para que eles me impedissem de falar. Eles logo quiseram fazer um exorcismo brabo comigo, que deixaria a inquisição na época medieval parecendo um jardim de infância.
Eu estava pensando, mh mh. Será que eu estou errado? Ou será que são as pessoas que gostam tanto do transporte daqui que vivem em uma dimensão paralela e nosso encontro era só uma mera coincidência? Um encontro passageiro dentro de uma viagem em um buraco negro, de onde nos saímos de lados opostos e nos cruzamos em um encontro rápido? Todo mundo tem que ver por si mesmo quem esta errado e quem tem só uma visão diferente das coisas. Então vou contar as experiências que me fizeram reclamar.
Recém-chegado aqui, eu queria fazer um tour de ônibus pela cidade para ver a vizinhança. Peguei um ônibus que andava pelo centro da cidade. As ruas aqui são estreitas e entupidas de carros e de onibus. Fiquei no ponto esperando e logo chegou um ônibus vermelho de dois andares. Eu tive muita sorte porque eu consegui uma vaga no segundo andar.
Começou o meu sightseeing; o ônibus andava por uma das ruas principais quando, de repente, ele parou e eu escutei um tumulto que estava acontecendo lá embaixo. Pensei que alguém estava passando mal ou que era um assalto. Um assalto? Não poderia ser, sai do Terceiro Mundo para me livrar da violência, então não pode ser. Desci para ver o que estava acontecendo. O motorista, sem qualquer preconceito, era um africano. Ele botou todo mundo para fora do ônibus, porque a rua estava toda engarrafada e ele queria ir para casa e não queria enfrentar este transito. Ele disse que nos teríamos que pegar um outro ônibus para seguir a nossa viagem.
Alguns meses atras, peguei o metro. Como eu sou paraguaio, eu tenho a minha rotina. Eu viajo todos os dias na mesma hora, no mesmo trem e sento na mesma poltrona. Este trem vai me deixar no meu destino, que e o ponto final da linha. Não tem erro. Quer dizer, nada e perfeito.
Um belo dia, como sempre, eu estava na viagem perfeita e, como sempre, lendo o meu jornal gratuito (por causa do valor da passagem eu não consigo compra o jornal normal, que custa 30 pence). Realmente eu estava despreocupado, lendo o jornal, quando eu olhei para fora do trem e vi uma vegetação totalmente diferente. A minha mente queria me enganar, não aceitei bebida de um estranho, nem consumi drogas.
Os pensamentos mais loucos e confusos passaram pela minha cabeça: será que o Marty McFly e Dr. Emmet Brown, de De Volta Para o Futuro, sao os condutores deste trem? Houve um problema com o “flux capacitor” e nos não conseguimos voltar ao um futuro de um transporte de massas melhor? Mas logo chegamos a uma estação ferroviária que eu nunca tinha visto na minha vida, e eu já rodei muito pelo mundo.
Eu sai do trem. Junto comigo saíram um monte de trabalhadores poloneses, que pareciam um bando de baratas tontas e desorientadas. Então peguei um trem que voltaria para a outra direção, junto com os poloneses. Este pequeno desvio me custou trinta minutos.
No dia seguinte, eu falei com um cara que sempre viaja comigo, mas sempre dorme e só acorda no ponto final. Pensei que ele deveria só ter acordado no fim de mundo; então perguntei, “O que houve ontem com nossa condução?” Ele me respondeu que “haviam feito um anunciou curto em um idioma que nem e mais falado, voce sabe, quando voce e crianca e enfia a sua cabeca dentro de uma balde de agua e tenta falar”? Assim foi o anuncio. Mas o que aconteceu mesmo? O trem de uma outra direção foi cancelado e o meu teve que fazer o trajeto dele. Ele ainda disse que ele teve sorte e saiu do trem e não se atrasou.
Uma outra coisa interessante sempre acontece comigo quando eu estou chegando de trem na estação onde eu tenho que trocar de trem. De longe, eu já vejo o trem que eu quero pegar parado na plataforma e fico feliz da vida, pois penso: Hoje vou te pegar sem problema. Mas quando entro na estação, o trem que esta parado fecha as portas e sai ou entao, enquanto ele ainda esta lá de portas abertas e o trem em que eu cheguei já parou, o trem onde estou só abre as portas quando o outro fecha as dele e sai da estacao. Coisas loucas.
Quantas vezes eu fiquei esperando numa plataforma sem aviso nenhum e só trinta minutos depois, quando já passaram vários outros trens, dão um anuncio dizendo que, por uma falha de sinalização, não tem um trem da minha linha hoje.
Tem coisas inexplicáveis, especialmente durante os finais de semanas. Tem um trem Express que só para a cada três estações e um trem comum que para em cada “esquina”. Então o trem expresso tem oito vagões onde normalmente viajam somente dez pessoas, quase que igualmente distribuídas. Como eu sei? Porque ele para na nossa plataforma, mas só que ele não para nas estações onde a maioria quer ir. Chegou a minha condução. Um trem de quatro vagões já lotados e na plataforma mais gente espera, quase a população inteira da China, ainda querendo entrar.
A minha mãe teve uma boa experiência aqui. O trem que ela queria pegar chegou já lotado e a plataforma estava entupida de gente. Por uma falha de sinalização, uns três trens deixaram de circular. Mas o pessoal continuava chegando na estacao e a plataforma encheu mesmo. Quando finalmente um trem parou, já estava lotado. A minha mãe, que já e uma senhora, teve sorte porque o trem parou com as portas na frente dela. Quando as portas abriram, as pessoas de dentro do trem quase caíram na plataforma, tao cheio estava o trem. Ela só sentiu que um negro que estava atrás dela colocou o seu joelho na bunda dela e tentou empurrá-la para dentro de trem, mas meu pai conseguiu tira-la de lá.
O ultimo episodio aconteceu quando eu tinha um compromisso. Eu tinha uma hora certa para chegar em casa, porque eu estava esperando uma visita. Eu já tinha perdido o primeiro trem. Quando eu cheguei na plataforma, quase com um pe já dentro do trem, as portas fecharam e as pessoas que conseguiram entrar fizeram o sinal de “L” (loser) para mim. Peguei o outro dez minutos depois. Foi uma viagem tranqüila ate quase o meu ponto de saída. Umas duas estações antes da minha, o trem ficou parado por vinte minutos sem aviso nenhum. Lá estava eu, dentro de um trem sem ar-condicionado e cheio de gente num dia quente. As pessoas já pareciam frangos de padaria, cozinhando lentamente. Um cheiro azedo já estava cortando o ar que eu respirava. Depois de algum tempo, você lembra da historia do balde cheio de agua e tenta falar uma frase inteira. Então o condutor do trem, com a voz de um excêntrico que gosta de vestir roupa de borracha bem apertada la nos balangandãs dele, diz, quase chorando, que alguns passageiros quebraram a porta de um vagão e os demais passageiros tem que sair do trem. Eu já sabia que a empresa de transporte comprava portas feitas no Paraguai e que um cara esperto vendeu-lhe portas feitas na China. Isto acontece quando você compra um material de quinta categoria e, se alguém encosta, já quebra.
Mas enfim, todo mundo teve que sair do trem e esperar na plataforma. Só que a plataforma já estava lotada e, com mais gente chegando, a situação ficou complicada. Ninguém dizia em quanto tempo chegaria o outro trem. O trem quebrado ficou na plataforma sem se mexer, como um símbolo de anarquia e de passageiros vândalos. Realmente só tinha homens de ternos e mulheres de conjuntos, a pior raça, gente muito braba. Os funcionários da estação ficaram parados em frente do trem e às vezes apontavam para a porta quebrada, parecendo querer lembrar a todo mundo que isto vai custar, vão aumentar a tarifa. Eu acho que uma boa martelada resolvia o assunto da porta. No fim, eu tive que pegar um ônibus e esta aventura me atrasou uma hora e meia. E agora, vocês acham que estou errado?
